O Núcleo de Estudos sobre a Violência contra a Mulher Simone de Beauvoir (NEM), que é composto por professoras e alunas da Faculdade de Serviço Social (FASSO) da Universidade do Estado do Rio Grande do Norte (UERN), está desenvolvendo estudos voltados à semana do Dia Internacional de Combate à Violência Contra a Mulher, lembrado em 25 de novembro. O núcleo já está discutindo todas as temáticas da violência nesse sentido, com ênfase para a violência no traba-lho.
Para chegar a um diagnóstico, as integrantes do NEM realizaram uma pesquisa com 45 mulheres que trabalham em shoppings, supermercados e comércio de rua, sobre a esfera do trabalho, pesquisa essa que foi feita em parceria com o Sindicato dos Empregados do Comércio de Mossoró (SECOM). "Dos dados de violência no trabalho, pudemos perceber que as comerciárias são as que mais sofrem e 70% dos casos são de assédios e eles estão no comércio. O assédio moral é o que mais acontece", disse a professora Fernanda Marques.
Dentro da pesquisa foi apontado que 71,1% do tipo de violência são relacionadas à fofoca, 51,1% revista de bolsas, 48,9% para a imposição da realização de tarefas impróprias para a função, 28,9% provocação. Ainda foram apontados humilhação, intromissão de vida privada, sobrecarga de trabalho em curto prazo, agressões verbais, rebaixamento de cargo ou função, ridicularização, entre outros.
A ação que marca a semana tem como tema: "O Feminismo denuncia: a violência contra as mulheres continua e as políticas públicas ainda são muito incipientes". "Mossoró não tem nenhum lugar especializado para receber denúncias de violência no trabalho", afirmou a professora Fernanda Marques.
As ações foram concentradas no Campus Central da Uern, como forma de alertar os estudantes. "Sabemos que atingindo o público da Universidade, atingimos a sociedade como um todo, pois a mensagem chega às suas famílias e aos seus bairros", destacou a professora Janaiky Almeida.
Outro problema relacionado à violência contra mulher é a não existência de um espaço de denúncia ou acompanhamento psicológico em Mossoró nos finais de semana ou feriados. "Hoje em dia quando a mulher liga para o 190 e a polícia não vai porque só quem resolve é a Deam, que não funciona à noite, nem finais de semana ou feriado", continuou Fernanda Marques.
Para as professoras, Mossoró é carente de ações de combate. "Reconhecer que existe a violência e divulgar a Lei Maria da Penha é falácia. As mulheres continuam abandonadas. Temos um atendimento mecânico", afirmou a professora Telma Gurgel.
Esse atendimento mecânico citado pela professora se refere ao Conselho Municipal de Combate à Violência contra a Mulher, que, de acordo com as professoras não funciona, a não ser quando é data de realização de conferência, que é prevista em lei. "O município só alega questões voltadas à saúde, questões essas que só atendem a gestantes e mulheres com doenças sexualmente transmissíveis, com distribuição de preservativos, quando tem. É uma coisa mecânica, como cumprimento de regras", continuou Telma Gurgel.
As integrantes do NEM, que também compõem o Observatório Nacional de Combate à Violência contra a Mulher (OBSERVE), informaram que foi realizada uma pesquisa com dados da Delegacia Especializada no Atendimento à Mulher (DEAM) e puderam perceber que, em se tratando de violência doméstica o número de ameaças já ultrapassa o de lesões. Até outubro deste ano foram registradas 469 ameaças, para 182 lesões. "As mulheres não entendem as ameaças como violência porque existe todo um contexto por trás disso. Elas não conseguem romper com um ciclo porque existe uma ligação afetiva por trás dessa violência", destacou a professora Marwyla Lima.
Fernanda Marques afirmou que ainda não foi realizada uma pesquisa junto ao Juizado da Mulher, mas que, segundo o juiz responsável, 70% das mulheres se retratam, quando o caso é a violência doméstica, e os outros 30% desistem no dia de levar as testemunhas. "Elas pedem para que as testemunhas não deponham, dizem que já resolveram o caso", disse.
O homem também não tem como passar por um acompanhamento psicológico. "Não existe em Mossoró um programa de reabilitação dos agressores. Eles são levados para o Caps, mas nós sabemos que nem todos sofrem transtornos. O problema é que a Prefeitura se comprometeu em criar políticas públicas nesse sentido e isso não está sendo visto", afirmou Fernanda Marques.
Em outra pesquisa realizada pelo Núcleo, dessa vez sobre as políticas públicas, as pesquisadoras estiveram em 15 Unidades Básicas de Saúde (UBSs) na zona urbana e rural. "As usuárias reclamaram da demora no atendimento e na marcação de exames, além do número limitado de vagas. Essa situação acaba agravando qualquer problema de saúde. Elas também apontaram dificuldades para aquelas que trabalham, ou com relação à insegurança para chegarem aos postos de saúde ainda de madrugada para pegar ficha", afirmou Janaiky Almeida.
A carência dessas políticas públicas acaba sendo uma das maiores problemáticas nesse sentido. "Parece que Mossoró é a terra do já existiu. Aqui já existiu um Centro de Saúde Reprodutiva, que foi desativado em 2006 para ser implantado um serviço que ainda não funciona. Aqui só existe hoje um juizado de violência doméstica e familiar, uma Deam que não funciona às noites, finais de semana e feriado, e um Creas Mulher, com serviços limitados. Já fizemos ofícios para Governo, Prefeitura. Mas até agora só a deputada Larissa Rosado que se pronunciou a favor dessa luta na Assembleia Legislativa. O que percebemos é que a politicagem predomina", frisou Fernanda Marques.
O que deveria existir, segundo as professoras, seria uma casa de abrigo, somente para as mulheres, já que o município possui uma casa de passagem para mulheres, homens e crianças. "Só existe uma casa como essa no Estado, é em Natal. Também deveria existir mais centros de referência voltados para a mulher, em locais mais acessível. Esse ano completamos cinco anos de Lei Maria da Penha, mas temos que avançar muito para tirá-la do papel".
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